Eu lá fui ao quintal procurar as violetas. Tirei-as com jeitinho pela raíz. Depois, levei-as para a “Casa das Bengalas” embrulhadinhas em jornal.
Quando cheguei ao quarto do avô, ele disse logo:
– Vamos lá para fora plantá-las. Está um lindo dia!
- Vamos!
- Os meus pais olhavam-no e viam a alegria de estar junto de mim. Mas eles tinham de ir para o Porto, logo de seguida, e não queriam ser “desmancha-prazeres”. Pois bem, estava decidido. Eles vieram segredar-me, dizendo:
– Filho, temos de ir. Ficas aqui com o avô e à noite vais dormir a Torna-ó-Rego.
– Que maçada – mas lembrando-me que era pelo avô, aceitei.
O avô trabalha muito melhor do que eu e eu fui aprendendo com ele. No fim deu-me um grande abraço, que lhe apetecia ser eterno.
Ao anoitecer, fui dormir a casa dele, em “Torna-ó-Rego”. Quando acordei, fui à venda comprar trigo e manteiga. Tomei o pequeno almoço e fui vaguear por aquela aldeia tão pobre.
Encontrei dois meninos gémeos, mais ou menos da minha idade:
– Como te chamas? – disse eu.
– Chamo-me Rui e o meu irmão chama-se Pedro. Queres acampar connosco?
– Sim, apetecia-me mesmo.
– Por agora, estamos só a procurar um sítio bom para acampar.
– Eu tenho, eu tenho – disse eu.
– Tu tens o quê? – disse o Pedro.
– Tenho um sítio bom. Vinde cá! É na casa do meu avô. Lá é que é bom!
Como eles eram muito parecidos, eu nunca acertava no seu nome.
Fizemos uma tenda lá no quintal. Eu já começava a gostar de estar em Torna-ó-Rego. Quando acabámos, senti que algo me ligava aquelas violetas muito roxas. Então fui ligar a mangueira e reguei-as com cuidado.
No fim, fui com eles os dois à sua casa.
– Ó Pedro que é que vamos fazer a tua casa?
– Eu não sou o Pedro, sou o Rui.
– Desculpa lá, Rui.
– Vamos a casa para pedir à minha mãe para almoçar contigo na tenda.
– Chegamos!- disse o Pedro.
Eu fiquei a observar a casa deles. Era baixinha, pintada de branco e tinha um telhado muito cor-de-laranja que se sobressaia. Era mesmo gira!
– Ó mãe, deixa-nos almoçar com ele?
– Não, não!
– Ó mãe deixe, por favor!
– Ó mãe do Rui e do Pedro deixe-os vir, só hoje!
– Está bem, eu deixo, mas com cuidadinho.
Levai esta garrafa de 7up e copinhos de plástico. Levai este arroz que já está adiantado e também esta salada. Só é preciso cortar os tomates às rodelinhas. Têm que ter cuidado com eles: estão muito maduros. Tudo dentro de uma cesta, mas fazei tudo com cautela!
– Está bem, mãe – disseram eles quase em coro.
Depois de chegarmos lá, fomos acabar de preparar o almoço para não comermos tarde.
Uf! Ainda bem que a mãe deles deu comida para todos porque se não, lá ia eu à venda!
– De tarde vais estar em casa? – perguntou o Pedro.
– Não vou visitar o meu avô.
– Mas, então o teu avô não vive aqui?
Eu lá tive que contar como tudo se passou. Aquele almoço estava mesmo delicioso!
– Sim senhor, a vossa mãe é uma artista a fazer cozinhados. Tchau, tenho de ir, senão, chego lá muito tarde.
– Tchau.
– Adeus.
Eu ainda tinha quinhentos escudos. Devia dar para ir até ao lar de camioneta, mas preferi gastá-los na vinda para cá. Comecei a “dar à sola”!
Cheguei lá, o meu avô já estava à minha espera. Falei-lhe do Rui e do Pedro e o meu avô disse rapidamente:
– Ah aqueles meninos simpáticos. Olha, brinca com eles à vontade, são de boa gente.
– Realmente nos cozinhados
– O quê? Não ouvi.
– Nada. Esqueça.
– Vamos regar as violetas?
– Vamos!
– Olha, depois, pega numa e oferece à tua mãe! Ela já te bem buscar hoje!
– Ó não! – Falei eu cá com os meus botões. Agora que eu já estava a gostar de viver em Torna-ó-Rego
Ena! Já tinha um plano, um bom plano.
– Avô, posso pegar antes em duas?
– Podes!
– Ó avô, gosta mais de estar aqui ou na sua casa?
– Gosto muito mais de estar em minha casa. Que saudades!
Podíamos estar em casa os dois a trepar as árvores para comer figos! Olha que, apesar da minha idade, estou rijo!
Eu pus-me a chapinhar na água.
– Vá, não faças isso. Ainda estragas as violetas e ficas doente.
– Olha é o pai e a mãe!
– Vai ter com eles!
Eu lá fui levando atrás das costas as duas violetas.
– Mãe e pai, olhem o que eu tenho aqui! É para vós!
– Que bonitas! – Disse a mãe.
Mas dou-as com uma intenção: é para pedir para tirar o avô do lar e levá-lo para casa.
-Mas quem fica com ele?
– Fico eu.
– Não, filho!
– Sim, eu telefono todos os dias. E vemo-nos ao fim de semana.
– Está bem!
Tivemos esta conversa e o avô nem soube. Ele quando soube deu um suspiro e disse:
– Graças às violetas!
(Cristina Cruz, 11 anos – Escola EB 2,3 de Barcelinhos)